terça-feira, 3 de abril de 2012

BIBLIOTECA NACIONAL DEMITE JORNALISTA POR CAUSA DE RESENHA DE "A PRIVATARIA TUCANA"



Resenha de ‘A privataria tucana’ causa demissão de jornalista na revista da Biblioteca Nacional


fonte: Carta Capital


A demissão de dois profissionais da revista de História da Biblioteca Nacional semanas após a publicação de uma resenha favorável ao livro “A Privataria Tucana”, do jornalista Amaury Ribeiro Jr – fato que despertou a ira de parlamentares do PSDB, alvo de denúncias na obra – colocou o veículo no centro de uma polêmica sobre uma suposta intervenção do partido no caso. A demissão foi apontada na imprensa na coluna do jornalista Elio Gaspari, na Folha de S. Paulo, da quarta-feira 28.  


Publicado em 24 de janeiro, o texto do jornalista Celso de Castro Barbosa foi alvo críticas de tucanos, que liderados pelo presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE), ameaçaram processar a publicação, editada pela Sociedade de Amigos da Biblioteca Nacional (Sabin) e que da Biblioteca Nacional recebe apenas material de pesquisa e iconografia.


Como resultado, a revista retirou a resenha do ar. “Fui censurado e injuriado”, diz o jornalista em entrevista a CartaCapital.


Barbosa destaca que a remoção do texto ocorreu apenas “após o chilique do PSDB” em 1º de fevereiro, nove dias depois da publicação em destaque na primeira página do site da revista. O motivo seria uma nota divulgada em um jornal carioca, segundo a qual a cúpula do partido estava “possessa” com a revista, tida pela legenda como do governo.


A evidente pressão externa fez com que o jornalista recebesse um chamado do editor-chefe da publicação, Luciano Figueiredo, naquele mesmo dia. “Ele [Figueiredo] disse concordar com quase tudo que havia escrito, mas o Gustavo Franco [ex-presidente do Banco Central no governo FHC] leu, não gostou e resolveu mobilizar a cúpula tucana.”  


Para conter o movimento, relata, o editor-chefe se comprometeu a escrever uma nota assumindo a culpa pela publicação do texto. “Eu disse: ‘Culpa de que? Ninguém tem culpa de nada. É uma resenha de um livro.’”


No dia seguinte o diário O Globo destacou a história e um pronunciamento da Sabin a dizer que os textos da revista são analisados pelos editores, mas aquela resenha não havia sido editada. “Subentende-se que publiquei por minha conta”, ironiza Barbosa.


Por outro lado, em matéria publicada na terça-feira 27 no site do Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro, dois editores da revista, Vivi Fernandes de Lima e Felipe Sáles, desmentem a Sabin e confirmam ter editado a resenha antes da publicação no site.


Críticas a Serra


O texto de Barbosa destaca a vivacidade do jornalismo investigativo no livro e sugere que José Serra esteja “morto”. O ex-governador de São Paulo também é citado como a figura com a “imagem mais chamuscada” pelas denúncias, além de questionar a origem de seu patrimônio. (Leia o texto aqui)


Inconformado com a resenha, Guerra chegou a enviar cartas de protesto à ministra da Cultura, Ana de Hollanda, e a Figueiredo. Outros tucanos alegaram que a publicação era pública, trazia os nomes da presidenta Dilma Rousseff, e de Hollanda no expediente e recebia verba da Petrobrás. Logo, deveria se manter isentada de questões políticas.


Mas Barbosa destaca que a dona da revista é a Sabin. “Uma entidade privada, composta inclusive por bancos.”


O patrocínio, defende, não seria impedimento para a manifestação de opiniões no veículo. “Não está escrito na Constituição que em revista patrocinada pela Petrobras a manifestação contra eventuais adversários do governo é proibida.”


A revista, por outro lado, preferiu divulgar nota pedindo desculpas aos ofendidos pelo texto, além de alegar não defender “posições político- partidárias”.


Em meio ao ocorrido, Barbosa afirma ter sido ameaçado com um processo por Guerra e, após a pressão dos tucanos, seus editores avaliaram que seria menor que trabalhasse em casa.


Devido à situação, o jornalista revela ter questionado o posicionamento de Figueiredo em um email aberto à redação, no qual perguntava sobre a nota que o editor-chefe escreveria em seu apoio. “Ele escreveu uma nota mentirosa e deu para o presidente da Sabin assinar. Depois, em 29 de fevereiro, me demitiu.”


Sobre a reação tucana, Barbosa acredita que o partido poderia ter agido de outra forma. “Vivemos em um país livre e a Constituição me garante o direito à opinião.”


O jornalista se refere a declarações de parlamentares do PSDB, que o chamaram de “servidor público a favor do aparelhamento do Estado”. “Se há algum erro no tom, é deles [tucanos], não meu. Sequer tinha carteira assinada e cumpria jornada sem direito trabalhista.”


Um dos motivos pelo qual Barbosa processa a revista. “Na ação, também peço indenização por danos morais e uma retratação pela nota mentirosa.”


Procurada, a Sabin informou, via nota assinada pelo presidente da instituição, Jean-Louis Lacerda Soares, que “não interfere no conteúdo editorial da revista”, pois a “atribuição relacionada ao conteúdo é do Conselho Editorial”.


A sociedade nega ter sofrido interferência externa nas demissões e diz que o jornalista Celso de Castro Barbosa foi demitido pelo então editor Luciano Figueiredo, por sua vez, dispensado “exclusivamente por razões administrativas.”


A reportagem de CartaCapital também contatou Luciano Figueiredo por meio da assessoria de imprensa da Universidade Federal Fluminense, instituição na qual leciona, e foi informada de que o historiador não poderia dar entrevistas.


Outra tentativa foi realizada por email, mas não houve resposta do professor até o fechamento desta reportagem.


O PSDB divulgou, nesta sexta-feira 30, nota na qual afirma que a “a própria Revista de História da Biblioteca Nacional constatou ter cometido um erro ao publicar o artigo” e “lamenta o retorno do assunto”, ressaltando que “não teve nenhum tipo de interferência na demissão dos profissionais.”


Na nota, Guerra afirma que o partido tem o direito de ir contra a resenha e também à Justiça. Ele nega interferência no caso.


*Atualizado às 12h55 de sexta-feira 30.



PARA ENTENDER O CASO:
Coordenadora tenta forçar repórter da CartaCapital a se retratar sobre suposta participação da legenda na demissão de dois jornalistas


Por Gianni Carta 

O PSDB E A LEVEZA DO PAQUIDERME


A cúpula do PSDB, ao lidar com jornalistas que criticam seus integrantes e legenda, age com a leveza de um paquiderme. Deixa pegadas por onde passa na sua tentativa de forçar repórteres a se retratarem – no caso de CartaCapital esforço vão. Foi o que fez Adriana Vasconcelos, coordenadora de Comunicação Social da Executiva Nacional do PSDB, em conversa telefônica na sexta-feira 30 com Gabriel Bonis, jornalista de CartaCapital.


Vasconcelos ligou acelerada e a falar em tom alto para reclamar de artigo publicado pelo website do semanário intitulado “Resenha de A Privataria Tucanacausa demissão de jornalistas da Revista de Históriada Biblioteca Nacional”. Em poucos termos, Bonis aprofundou uma nota do jornalista Elio Gaspari, no qual o colunista conta como uma resenha de autoria de Celso de Castro Barbosa favorável ao livro de Amaury Jr. sobre as falcatruas do PSDB deixou “possessos” os líderes da legenda. Em seguida, Barbosa e o editor-chefe da publicação, Luciano Figueiredo, foram demitidos.


A lógica de Vasconcelos, repetida em carta para a direção de CartaCapital após a escaramuça telefônica com Bonis, é a seguinte: o “jovem repórter” (ela cisma em associar sua juventude à uma suposta falta de experiência ao longo do texto) teria sugerido que o deputado Sérgio Guerra, presidente do PSDB, “pediu a cabeça” dos jornalistas. E, “segundo as regras da ética do bom jornalismo” o “jovem” deveria ter ouvido a direção nacional do PSDB antes de publicar sua matéria.


Pequeno e crucial detalhe: em momento algum Bonis sugere que Guerra teria, como enfatizou Vasconcelos, “pedido a cabeça” dos jornalistas da Revista de História. O jornalista simplesmente relata o que constava na mídia, e inclusive no website do PSDB.


A cúpula do PSDB não acha esquisito dois jornalistas serem demitidos após a legenda ter colocado pressão na Revista de História?


O PSDB, vale exprimir, considera a Revista de História como uma publicação governamental. E pelo fato de receber verba da Petrobrás deveria se manter isenta de questões políticas. Vasconcelos, de fato, defendeu essa tese no entrevero com Bonis. No entanto, a publicação é da Sociedade de Amigos da Biblioteca Nacional (Sabin,) que, embora seja uma sociedade sem fins lucrativos, cobra taxas de associação anuais a variar de um salário mínimo a mais de 20 mil reais. A Sociedade é composta inclusive por bancos como o Bradesco e o Itaú. Além disso, a Revista de História é vendida em bancas e por assinatura, logo tem fins comerciais.


Por meio de uma nota, o presidente da Sabin, Jean-Louis Lacerda Soares, afirmou que “não interfere no conteúdo editorial da revista”. E emendou: “A atribuição relacionada ao conteúdo é do Conselho Editorial”. Em suma, Barbosa tem o direito de opinar sobre A Privataria Tucana naRevista de História. Deveria.


A Petrobrás anuncia, aliás, em várias publicações e mesmo assim todas elas têm a liberdade de criticar o PSDB. Isso, claro, acontece pouco, para não dizer nunca, visto que a vasta maioria desses periódicos têm tangíveis pendores tucanos.


Por exemplo, Luciano Figueiredo, o editor-chefe da Revista de História, portou-se de forma nebulosa. Em entrevista para CartaCapital, Barbosa contou que Figueiredo “concordou com quase tudo que eu havia escrito”.


No entanto, tudo leva a crer que houve pressão para levá-lo a mudar de ideia. Guerra enviou uma carta de protesto a Figueiredo, e outra à ministra da Cultura, Anna de Hollanda. Consta que Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central no governo de FHC, teria sido um dos mais ativos mobilizadores na campanha contra a resenha de A Privataria Tucana.


Resultado: Figueiredo escreveu nota, assinada pelo presidente da Sabin, na qual diz que o texto do jornalista não havia sido revisado pelos editores da publicação e se desculpa com os possíveis ofendidos. Em seguida demitiu Barbosa, e, ironia das ironias, foi dispensado pela Sabin por “razões administrativas”.


Por sua vez, o PSDB reagiu na sexta através da seguinte nota: “A própria Revista de História da Biblioteca Nacional constatou um erro ao publicar o artigo”.


Mas que erro cometeu Barbosa?


Vasconcelos teve a bondade de nos presentear com uma nota redigida, em 28 de março, por Sérgio Guerra. O deputado nega interferência nas demissões. E escreve: “O PSDB tem todo o direito de protestar contra a resenha do livro “A Privataria Tucana” pela “Revista História”, da Sociedade de Amigos da Biblioteca Nacional. Terá também todo o direito de ir à Justiça”.


E Barbosa não tem direito de protestar contra os protestos tucanos?


Pressão por parte da legenda houve. Na conversa telefônica com Bonis, de fato, Vasconcelos não negou que o PSDB fez pressão, embora não tenha pedido cabeças. Houve as cartas para Figueiredo e para a ministra Anna de Hollanda.


E houve o telefonema para Bonis.


Vasconcelos diz na carta (mais uma) endereçada para CartaCapital que o jornalista da revista ficou “irritado”. Foi Bonis, aliás, quem a incentivou a enviar a carta. Este que escreve estava ao lado de Bonis durante a contenda telefônica. Ele é um jornalista calmo, prolífico e um dos mais talentosos que temos. Continuou calmo, mas foi duro quando a coordenadora tucana começou a repetir, ininterruptamente e aos berros, que ele não havia falado com o Guerra. Bonis então disse que se a coordenadora não o deixasse se exprimir seria obrigado a desligar.


Vasconcelos continuou a gritar que ele não tinha procurado Guerra e desligou o telefone na cara do jornalista. Disse que vai “estudar a possibilidade de um processo”.

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